Sobre a literatura social
Tradução: Luiz Fernando dos Santos Velloso Blois
Revisão e cotejo: Felipe Chaves Gonçalves Pinto
HTML: Felipe Chaves Gonçalves Pinto
Texto original: "Shakaiteki bungaku nitsuite". In: Kokuen, vol. 2, n. 1, p. 53-56, 1920. Disponível em: Arquivo pessoal. Acesso em: 28/02/2025.
Este texto está licenciado por: Licença Creative Commons Atribuição-CompartilhaIgual 4.0 Internacional (CC BY-SA 4.0).
Sumário
I
Jovem Fuji
Apesar de frequentemente ter prometido contribuir com os textos, sempre que o prazo chega, acabo não honrando o combinado e sinto-me extremamente culpado.
Se eu continuar enrolando dessa vez também, parece que isso vai acontecer de novo. Eu nunca estive tão atarefado quanto nesse fim de ano. Afinal, devido ao crescimento das revistas e o aumento das publicações, resultou a necessidade de preencher as páginas com diversos textos. Assim, é provável que devido às extremas dificuldades de atender à demanda, as revistas acabam vindo até nós em busca de ajuda.
Ao refletir sobre isso, se eu acabasse recusando completamente os pedidos, me sentiria profundamente insensível e por isso acabei aceitando-os todos. Os compromissos que ainda não entreguei são três publicações em revistas e duas em jornais, além de ter dois trabalhos contínuos que já havia aceitado.
Chegando neste momento, sinto que os trabalhos que realizo são, meramente, escrever e entregá-los.
Dentro desse processo, sinto que, de qualquer forma, quero ao menos honrar os compromissos. Contudo, mesmo que a caneta esteja se movendo, não me vem nenhuma boa ideia. Existe o jargão popular “Falar de forma contínua, como se a parte superior da mandíbula se colidisse com a inferior”, no meu caso, teria que dizer que é como se eu escrevesse incessantemente, com a caneta colidindo com o papel.
II
Pode-se dizer que estamos numa sociedade que parece desejar o surgimento de publicações de uma típica literatura socialista e trabalhistas e, isso, é desejado por todos nós. No entanto, ao fazer esse tipo de literatura, não podemos deixar de sentir uma profunda inveja dos escritores estrangeiros que estão numa inata posição vantajosa. Isso é, aliás, algo que não preciso dizer, mas as pessoas que já tentaram escrever esse tipo de literatura sabem melhor do que ninguém com base nas suas próprias experiências.
Primeiramente, há a deficiência dos escritores japonês em relação aos acessos teóricos.
Trabalhos como Paris ou Germinal de Zola são extremamente difíceis de encontrar no Japão (se existe ou não liberdade para escrever sobre eles, deixo como uma outra questão). Pode ser que materiais como os de Os Companheiros de Gorki possam não surgir logo, e de obras como Seviyolov de Artsybashev, por exemplo, simplesmente não se formem no Japão.
Por isso, a literatura social e trabalhista não se tornará imediatamente algo grandioso e militante como acontece no exterior. Se for esse o caso, ao menos por enquanto, parece que, em vez de retratar uma fração consciente da sociedade ou uma parte dos trabalhadores conscientes, deveria haver mais representações vívidas da miséria da sociedade inconsciente e da condição dos trabalhadores inconscientes. E, através dessas representações, o caminho que eles devem seguir, bem como o caminho que nós devemos seguir, poderia ser sugerido Dessa forma, enquanto produto artístico, talvez nesse tipo de caminho surjam obras boas e bem alicerçadas.
Ao fazer esse tipo de literatura, criando apenas personagens idealizados de uma perspectiva externa, não se tornará algo concreto. Deve ser uma pessoa que ao menos tenha contato, impreterivelmente, com os trabalhadores ou com as classes mais baixas da sociedade, pois se não houver esse tipo de consideração, é improvável que boas obras desse tipo venham a surgir. Dizendo de uma forma mais direta, a pessoa que vivenciou a vida das classes mais baixas é a mais apropriada para criar as obras. Contudo, essa é a parte mais difícil, pois não basta ser pobre para conseguir escrever bem sobre os pobres. Resumindo, é necessário ter discernimento suficiente para escrever, possuir habilidade e, além disso, ter emergido do meio dos pobres, o que torna a tarefa extremamente complicada.
Por outro lado, podemos dizer que os romances e as peças teatrais são relatos de uma observação da vida. Assim, inevitavelmente acabam ou por registrar como observador externo, ou por relatar posteriormente os padrões das próprias batalhas vivenciadas pelos autores. Parece-me que são essas as duas categorias possíveis.
Dessa forma, o escritor não precisa necessariamente ter participado da batalha que descreve, nem precisa escrever sobre uma batalha que esteja presente. Pelo contrário, o observador pode atingir uma observação mais profunda e ao registrar uma batalha que já passou, ele pode ser capaz de captar o verdadeiro significado dessa guerra.
Então, mesmo que após se tornar escritora a pessoa que emergiu do meio dos pobres diminua significativamente seu nível de contato com os pobres, isso não significa que se possa necessariamente concluir que uma descrição verdadeira da vida na pobreza não virá dessa pessoa.
Além disso, mesmo que alguém que tenha sido trabalhador se torne escritor e sua vida não pertença mais a essa classe, se essa pessoa tiver um verdadeiro talento literário, penso ser natural que, ainda que não seja mais um deles, de sua mão surja descrição autênticas da real vida dos trabalhadores e dos seus reais interesses.
Gostaria que essa distinção fosse suficientemente estabelecida. Portanto, ao avaliar uma obra de arte, seu valor deve ser julgado de acordo com os ideais, eventos e técnicas, e não pela condição temporária da vida ou pelo contexto social do escritor.
Desejaria estruturar melhor minhas as ideias e escrever de forma mais detalhada, mas como o prazo estabelecido é até o final da tarde de hoje e já estamos quase na hora, infelizmente encerro aqui minha escrita.
Na próxima vez, ao menos gostaria de organizar melhor meus pensamentos e entregar algo mais estruturado.
(Entardecer do dia 11 de dezembro)
(Janeiro de 1920, Kokuen)